segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Tragédia na Região Serrana: Sobrevivente de Teresópolis perdeu 29 parentes

Amanda Caetano Ferreira espalhou pela parede de casa as fotos dos 29 parentes que
morreram na tragédia em Teresópolis. Foto: Cléber Júnior / Extra



Aline Custódio e Talita Corrêa,Pedro Gabriel, Flávio, Maria do Carmo, Renata, Micaela, João Fabiano, Tatiana, Andressa,Ana Cláudia, Malvina, Luis Carlos, Isabela, Guilherme, Daniel, Igor, Marcelo, Nalanda,Caroline, José Carlos, Ivo, Roninha, Márcio, Juan. Mais ou menos no mesmo tempo quevocê levou para ler essa relação de nomes, Amanda Caetano Ferreira, de 24 anos, perdeu esses e outros seis parentes, cujos nomes o trauma a impede de lembrar. Hoje, eles são apenas quadros nas paredes da casa da morada de Campo Grande, Teresópolis.
- O tempo está fazendo a gente esquecer os nomes dos que morreram. As fotos servem para
não perdermos o rosto deles também - justifica Amanda.


No braço esquerdo, Amanda carrega a imagem do único filho, Pedro Gabriel, de dois anos.
Ela foi baseada na fotografia do bebê feita no aniversário dele, comemorado um dia antes da
tragédia.
- Vesti o Pedro Gabriel de marinheiro para a festinha e, por ironia do destino, meu filho
acabou morrendo pelas águas - desabafa.
Dos 29 parentes mortos de Amanda, dez jamais foram encontrados. Incluindo o marido
Flávio da Silva, de 28, o Viola. Ao juntar com os vizinhos também vítimas das três cabeças
d'água que arrasaram Campo Grande, Amanda contabiliza cerca de 250 amigos perdidos
numa única madrugada.
A jovem, que casou aos 15 anos sonhando em formar uma grande família, se viu praticamente
sozinha a partir daquela noite. Presa num pé de limoeiro por oito horas, ela sobreviveu em
meio à água e aos destroços.
Socorrida ao amanhecer, viu a destruição do lugar onde nasceu e se criou.
- Meu filho estava morto a mais de 500 metros de casa - recorda.
Mesmo com as feridas abertas pelo corpo, Amanda encontrou forças para carregar Pedro
Gabriel nos braços por 14 quilômetros até o Instituto Médico Legal. Para não perder o corpo
do menino antes de ele ser enterrado, ela vestiu quatro camisas e duas calças jeans sobre os
ferimentos e se tornou voluntária no IML por quatro dias. Foi responsável por lavar os corpos
das vítimas. Não tomou banho, não comeu e não bebeu durante 96 horas.
- Queria encontrar o meu marido para enterrá-lo junto com o meu filho - justifica.
A tentativa de localizar Flávio em meio aos corpos que se amontoavam no IML só cessou
quando Amanda desmaiou por conta da fraqueza e dos ferimentos. Foram três semanas no
Hospital das Clínicas de Teresópolis.
Ela ainda não conseguiu resgatar o seguro de vida deixado por Flávio em caso de morte.
Hoje, vive numa casa alugada, cujos fundos dão para o cenário da tragédia.
- Tenho que continuar vivendo. Agora, quero me tornar bombeira para ajudar outras famílias -
afirma.
Para não se sentir só, Amanda visita uma vez por semana o cemitério municipal de
Teresópolis. Lá, fica até 12 horas entre os túmulos. E é ao lado da sepultura do filho que ela
silencia. E deixa escorrer a lágrima.
O silêncio de Amanda ecoa do outro lado do morro que devastou Campo Grande. No Vale
do Cuiabá, em Petrópolis, a tragédia não distinguiu ricos e pobres. A fúria dos rios Cuiabá e
Santo Antônio arrasou mansões, pousadas inteiras e as casas simples dos ribeirinhos. Na
comunidade do Ponto Final, 14 das 22 casas foram arrancadas do mapa. As que ficaram em
pé, restaram destruídas. Hoje, a região virou linha vermelha (lugar inabitável) para a Defesa
Civil.
Em outro bairro também dizimado na serra, a Prainha, em Nova Friburgo, a sensação dos
moradores é de que continuam pisando sobre os mortos.
- Deve ter um monte de vizinhos engolidos pela terra ou arrastados pela água. Olho pro lugar
onde era a minha casa: um matagal. Algumas áreas foram sugadas pela terra - relata Jociléia
Oliveira, de 39.

Transcrito: Jornal Extra

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